o art. 12, § 2º. Este dispositivo prestigia o ideal de isonomia, ao dizer que “a lei não poderá estabelecer distinção entre brasileiros natos e naturalizados, salvo nos casos previstos nesta Constituição.” Dito de outra forma, os brasileiros natos e os brasileiros naturalizados devem ser tratados com igualdade, só sendo possível que haja algum tratamento diferente entre eles naqueles casos expressamente previstos pela própria Constituição. Desta forma, se uma lei discriminar um brasileiro nato ou um naturalizado, ela será considerada inconstitucional (contrária à Constituição).
Vejamos agora quais são os 4 casos em que nossa própria Constituição reconheceu que poderá haver um tratamento diferenciado entre brasileiros. Vamos conhece-los?
(1º) Cargos: conforme prevê o art. 12, § 3°, alguns cargos são privativos de brasileiros natos. Façamos a leitura do artigo para podermos conhece-los:
Art. 12(...) § 3º São privativos de brasileiro nato os cargos: I - de Presidente e Vice-Presidente da República; II - de Presidente da Câmara dos Deputados; III - de Presidente do Senado Federal; IV - de Ministro do Supremo Tribunal Federal; V - da carreira diplomática; VI - de oficial das Forças Armadas. VII - de Ministro de Estado da Defesa (Incluído pela Emenda Constitucional nº 23, de 1999)
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De início, creio ser importante que você saiba, meu caro aluno, que os cargos acima listados compõem uma lista que é taxativa (numerus clausus) e não meramente exemplificativa. Daí ser possível concluir que os cargos que não estão enunciados na lista não são privativos de brasileiros natos!
E se você estiver questionando se essa lista deve ser memorizada, eu lhe respondo: só por aqueles que desejam acertar as questões de prova! Ou seja: claro que deve! E não será difícil. Bastará notar que foram dois os motivos que orientaram nossa Constituição na reserva desses cargos estratégicos aos brasileiros natos:
- Motivo 1: os cargos que compõem a linha de substituição presidencial (Presidente da República, Vice-Presidente da República, Presidente da Câmara dos Deputados, Presidente do Senado Federal, Ministro do Supremo Tribunal Federal) são privativos de brasileiros natos. Assim, se o Presidente deve ser nato, todos aqueles que puderem ocupar a Presidência da República, ainda que temporariamente, também deverão ser natos. Em outras palavras, todos os substitutos do Presidente deverão ser natos. Quem são estes? De acordo com os artigos 79 e 80 da CF/88: o Vice, o Presidente da Câmara dos Deputados, o Presidente do Senado Federal, o Ministro Presidente do Supremo Tribunal Federal (que pode ser qualquer um dos seus 11 integrantes).
- Motivo 2: os cargos que envolvem questões de segurança nacional (membros da carreira diplomática, oficiais das Forças Armadas e Ministro de Estado da Defesa).
Identificados os cargos que só podem ser ocupados por brasileiros natos (e não por naturalizados), tenho alguns comentários adicionais para fazer:
(i) Note que os Deputados Federais e os Senadores podem ser brasileiros natos ou naturalizados. Somente os Presidentes das duas Casas Legislativas devem ser, obrigatoriamente, natos. “Então, é perfeitamente possível que um naturalizado se eleja Senador da República?” Sim, pois este cargo não é privativo de brasileiro nato. “Ele poderá liderar a minoria do Senado?” Sim, pois este cargo não é privativo de brasileiro nato. “Ele poderá ser o relator de uma comissão importante?” Sim, pois este cargo não é privativo de brasileiro nato. “Ele poderá ser o Presidente da Casa Legislativa?” Não, pois este cargo é privativo de brasileiro nato.
(ii) O STF é um Tribunal composto por onze Ministros (veja essa informação no art. 101, CF/88) e todos eles devem ser natos, já que qualquer um deles pode presidir a Suprema Corte.
(iii) Conforme determina o art. 76, CF/88 (que estudaremos quando a aula tratar do tema ‘Poder Executivo’), os Ministros de Estado são auxiliares do Presidente da República e, nos termos do art. 87, CF/88, podem ser brasileiros natos ou naturalizados. Somente o Ministro de Estado da Defesa deve ser, necessariamente, brasileiro nato (por razões de segurança nacional). “Quer dizer então que o Ministro da Educação pode ser um brasileiro naturalizado?” Sim, pode, pois este cargo não é privativo de brasileiro nato. “Quer dizer então que o Ministro da Economia pode ser um brasileiro naturalizado?” Sim, pode, pois este cargo não é privativo de brasileiro nato. “Quer dizer então que o Ministro da Saúde pode ser um brasileiro naturalizado?” Sim, pode, pois este cargo não é privativo de brasileiro nato. Aliás, lembremos de José Gomes Temporão que, nascido em Portugal, foi Ministro da Saúde no 2° mandato do ex-Presidente Lula.
(iv) É claro que nossa Constituição restringiria o acesso à carreira diplomática somente aos natos. Afinal, são os diplomatas que representam a República Federativa do Brasil no cenário internacional, em situações de conflitos e construção de acordos com outros Estados Nacionais. E não é absurdo supor que um naturalizado não defenderia os interesses do nosso Estado com o mesmo ímpeto quando estivesse, por exemplo, diante de interesses opostos do seu país de origem....
(v) Quanto aos demais cargos privativos de natos por motivo de segurança nacional, (oficial das forças armadas e Ministro do Estado da Defesa) a explicação torna-se ainda mais simples: imagine que os ocupantes pudessem ser naturalizados e estivéssemos em situação de guerra; será que o naturalizado acataria, por exemplo, uma ordem de ataque ao seu país de origem? Será que o Ministro de Estado da Defesa organizaria o uso das forças armadas brasileiras e um eventual ataque bélico contra seu Estado de origem? É justamente para evitar esses questionamentos que o Poder Constituinte Originário (poder responsável pela elaboração da Constituição) decidiu-se por exigir que esses cargos somente pudessem ser ocupados por brasileiros natos, para que ninguém, em momentos difíceis e estratégicos, se colocasse diante de dificuldades de consciência relativamente à lealdade que se deve à pátria.
(2º) Função: em conformidade com o que prevê o art. 89, VII, a Constituição reserva seis assentos no Conselho da República para brasileiros natos. Na aula sobre o “Poder Executivo”, estudaremos a função e a composição completa deste Conselho; no entanto, desde já, é interessante que você saiba que dele participam 6 cidadãos. Mas esses cidadãos devem ser, necessariamente, brasileiros natos (não podem ser naturalizados).
(3º) Extradição: o art. 5°, LI, CF/88, estabelece que o brasileiro nato não pode ser extraditado em hipótese alguma, ou seja, se for brasileiro nato, e estiver em nosso território, ele deverá ser processado e julgado aqui. Nunca será entregue, portanto, para a justiça de outro país, para que lá ele seja processado, julgado ou para que cumpra pena. E essa regra independe da gravidade do crime, e também do fato de o sujeito ter outra nacionalidade além da nossa.
Para facilitar, vamos imaginar dois cenários hipotéticos que ilustram bem essa impossibilidade absoluta de extradição do nato. Veja só:
(i) suponha que um brasileiro nato cometa um atentado terrorista em uma país estrangeiro, causando a morte de centenas de pessoas de diferentes nacionalidades e, logo depois, consiga voltar ao território nacional. Quando aqui ele é encontrado, vários países do mundo pedem sua extradição. O Brasil, todavia, não poderá concede-la, haja vista o fato de ele ser nato, o que impede que nosso país o extradite para outro; terá que ser processado/julgado aqui mesmo.
(ii) imaginemos, agora, que um brasileiro nato dotado de dupla nacionalidade – também é argentino – cometa um crime na Argentina e consiga se deslocar para o Brasil. Ainda que o governo argentino requeira sua extradição, a República Federativa do Brasil não a concederá, pois, apesar de ele também ser nacional do Estado requerente (Argentina), é brasileiro nato. E sendo nato, não pode ser extraditado pelo nosso país para outro; terá que ser processado/julgado aqui mesmo.
De outro lado, nossa Constituição permitiu a extradição do brasileiro naturalizado em duas situações: em razão da prática de um crime comum antes da naturalização e na hipótese de envolvimento comprovado com o tráfico ilícito de entorpecentes ou drogas afins. Vamos esmiuçar melhor cada uma delas:
(i) prática de um crime comum antes da naturalização: neste caso, para evitar que o indivíduo adquira a nacionalidade apenas como uma forma de não ser extraditado, impede-se a incidência da proteção contra a extradição se o sujeito tiver cometido um crime comum antes da naturalização, isto é, antes de lhe ser entregue o certificado de naturalização. Dois detalhes importantes: (1) se o crime não for comum (mas sim um crime político ou um crime de opinião), a extradição não poderá acontecer. Isso porque o Brasil não tolera e não é conivente com perseguições políticas; (2) se o crime comum tiver sido praticado após a naturalização, a extradição também não poderá acontecer. Para exemplificar, pensemos no fato real que desencadeou um processo extradicional (Ext. 1223), que foi julgado pela 2ª Turma do STF no ano de 2011: o crime comum fora praticado em território equatoriano em abril de 2007, mas a naturalização do sujeito como brasileiro havia acontecido em 1989. Como o crime era posterior à naturalização, claro que o Brasil não podia extradita-lo, porque a Constituição Federal não permite.
(ii) envolvimento comprovado com o tráfico ilícito de entorpecentes ou drogas afins: neste caso, a Constituição permite a extradição do brasileiro naturalizado independentemente de o crime ter sido cometido antes ou depois da naturalização, já que este é um crime que a República Federativa do Brasil se comprometeu, na ordem interna e internacional, a combater com severidade.
Antes de encerrarmos essa 3ª distinção entre brasileiros natos e naturalizados e passarmos à 4ª e última, quero dar destaque a uma informação: depois que você fizer a leitura dos incisos LI e LII do art. 5°, facilmente notará que a República Federativa do Brasil não concede a extradição de nenhuma pessoa em razão da prática de crime político ou de opinião. Isso porque: (i) brasileiros natos não podem ser extraditados em nenhuma hipótese; (ii) naturalizados só podem ser extraditados caso se envolvam com o tráfico de drogas ou cometam, antes da naturalização, um crime comum (nunca um crime político ou de opinião); (iii) os estrangeiros podem ser extraditados, em regra; todavia, a Constituição veda que sejam extraditados quando o crime praticado é político ou de opinião. 4º) Propriedade: o art. 222 da CF/88 estabelece algumas restrições referentes ao direito de propriedade de empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora de sons e imagens. Seguindo a lógica de que “quem tem informação tem poder”, nossa Constituição prevê que só poderão ser proprietários desse tipo de empresa os brasileiros natos ou então os que estejam naturalizados há mais de 10 anos. E tem mais: se essa empresa for uma sociedade, no mínimo 70% do capital total e votante deverá pertencer aos brasileiros natos ou naturalizados há mais de 10 anos.
Enfim, meu caro aluno, encerramos esse tópico referente às diferenças de brasileiros natos e naturalizados que são previstas expressamente (e de modo taxativo) pela nossa Constituição. Como última atividade antes de seguirmos para o item subsequente, sugiro que você visualize o quadro abaixo