Saiba que a naturalização é o único meio de aquisição da nacionalidade secundária. Ela pode ser dividida em duas espécies: (1) a naturalização tácita e (2) a naturalização expressa. Falemos sobre cada uma delas:
(1) A naturalização tácita (também chamada de ‘Grande naturalização’) é normalmente adotada em países que possuem um número de nacionais menor que o desejado e querem ser povoados. Para que isso ocorra, o texto constitucional determina que os estrangeiros residentes adquirirão automaticamente a nacionalidade do Estado em cujo território se encontram, caso não declarem, dentro de determinado período, o desejo de seguirem sendo estrangeiros, isto é, portadores da nacionalidade de origem. Ou seja, caso o sujeito se mantenha inerte, ele será automaticamente naturalizado. No Brasil, duas de nossas Constituições consagraram o mecanismo da grande naturalização: a Imperial (de 1824) e nossa primeira Constituição republicana (que foi a de 1891). É bom frisar que nossa atual Constituição (de 1988) não prevê a naturalização tácita, mas tão somente a expressa, que comentarei a seguir.
(2) Na naturalização expressa, por outro lado, colocamos a aquisição da nacionalidade secundária na dependência de uma declaração de vontade do interessado que, repare bem, só vai se naturalizar se quiser. Pode se efetivar por duas vias, a ordinária e a extraordinária. Nos tópicos a seguir, explicarei essas duas vias, começando pela ordinária (que é mais complexa, já que pode se efetivar de 4 diferentes maneiras).
(A) Naturalização ordinária
Conquistar a naturalização pela via ordinária é algo que pode se efetivar em 4 hipóteses. Vamos entender juntos cada uma delas. Mas, primeiro, vale fazermos a leitura do texto constitucional:
Art. 12. São brasileiros:
II - naturalizados:
a) os que, na forma da lei, adquiram a nacionalidade brasileira, exigidas aos originários de países de língua portuguesa apenas residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral;
Para começar, vou sugerir que você repare que a alínea ‘a’, consagradora da naturalização ordinária, deve ser fracionada em duas partes: (i) na 1ª parte (negritada), trataremos dos que vão adquirir a nacionalidade secundária brasileira na forma da Lei, sendo que a legislação traz 3 cenários possíveis para a aquisição; (ii) na 2ª parte (sublinhada), trataremos de uma naturalização ordinária facilitada para aqueles que vêm de países que, assim como o Brasil, também falam a língua portuguesa (ou seja, que partilham conosco uma parte de nossa história do período colonial).
(1ª) Art. 12, II, “a”, 2ª parte, CF/88: poderá se naturalizar brasileiro o sujeito originário de países que falam a língua portuguesa – não somente os portugueses, mas qualquer pessoa advinda de país que fale a língua portuguesa, como, por exemplo, Angola, Goa, Gamão, Moçambique, dentre outros – desde que seja possuidor de capacidade civil e preencha as duas exigências feitas pelo texto constitucional: (1) tenha residência ininterrupta em nosso país por um ano e (2) tenha idoneidade moral.
(2ª) Art. 12, II, “a”, 1ª parte, CF/88: diz a Constituição que poderão se naturalizar brasileiros os estrangeiros que cumprirem os requisitos previstos em lei. Que lei seria essa? É a Lei de Migração (Lei n° 13.445/2017), que revogou o antigo Estatuto do Estrangeiro (Lei nº 6.815/1980). A lei nova de Migração, em seu art. 65, estabelece as condições indispensáveis para a naturalização na via ordinária, quais sejam:
(i) ter capacidade civil, segundo a lei brasileira;
(ii) ter residência em território nacional, pelo prazo mínimo de 4 (quatro) anos;
(iii) comunicar-se em língua portuguesa, consideradas as condições do naturalizando; e
(iv) não possuir condenação penal ou estiver reabilitado, nos termos da lei.
É importante destacar que esses requisitos listados pela Lei de Migração no art. 65 são relativizados no dispositivo seguinte. Para exemplificar, note que o prazo de residência (de 4 anos) pode ser reduzido para, no mínimo, 1 ano, se o naturalizando preencher quaisquer das seguintes condições: (i) tiver um filho brasileiro; (ii) tiver um cônjuge ou companheiro brasileiro e não estar dele separado legalmente ou de fato no momento de concessão da naturalização; (iii) houver prestado ou poder prestar serviço relevante ao Brasil; ou (iv) recomendar-se por sua capacidade profissional, científica ou artística .
(3ª) A Lei de Migração, nos artigos 64, 68, 69 e 70, traz, ainda, duas outras hipóteses de aquisição da nacionalidade brasileira pela via ordinária: (i) a naturalização provisória e (ii) a naturalização especial. Vejamos cada uma dessas modalidades:
(i) Naturalização provisória (art. 70, Lei n° 13.445/2017): é um caminho facilitado de naturalização que existe para os que venham a morar no Brasil com até 10 anos de idade incompletos, desde que o requerimento de naturalização seja feito por seu representante legal antes do atingimento da maioridade. Essa naturalização será convertida em definitiva se o naturalizando expressamente assim o requerer no prazo de 2 anos após atingir a maioridade. Vou escrever com outras palavras, para confirmar que você realmente entendeu: porque chegou no Brasil com menos de 10 anos e o representante legal fez sua naturalização provisória enquanto ele era menor de idade, o sujeito poderá torna-la definitiva em um processo bastante simplificado, desde que apresente seu requerimento dentro do prazo de até 2 anos depois de conquistar a maioridade.
(ii) Naturalização especial: nos termos do art. 68, da Lei n° 13.445/2017, a naturalização especial poderá ser concedida ao estrangeiro que se encontre em uma das seguintes situações:
- seja cônjuge ou companheiro, há mais de 5 (cinco) anos, de integrante do Serviço Exterior Brasileiro em atividade ou de pessoa a serviço do Estado brasileiro no exterior; ou
- seja ou tenha sido empregado em missão diplomática ou em repartição consular do Brasil por mais de 10 anos ininterruptos.
Chegou o momento de concluirmos o estudo da naturalização ordinária. Mas, antes, vou lhe trazer duas informações que podem ser cobradas em prova:
(1ª) Mesmo que todos os requisitos listados na Constituição e na lei sejam satisfeitos, não se pode falar em direito público subjetivo à obtenção da naturalização ordinária. A concessão de nacionalidade é um ato de soberania estatal do Presidente da República, que pode, discricionariamente, negar-se a concedê-la. Vou escrever de outra forma: o mero cumprimento dos requisitos não vai assegurar ao indivíduo a obtenção da nacionalidade secundária brasileira, pois o Presidente fará uma análise quanto à conveniência e à oportunidade acerca dessa concessão.
(2ª) O procedimento de naturalização ordinária é sempre administrativo e transcorre perante o Ministério da Justiça até a decisão final do Presidente da República. Há, no entanto, um ato jurisdicional que finaliza o procedimento de concessão da nacionalidade: a entrega do certificado de naturalização feito pela Justiça Federal, nos termos do art. 109, X, CF/88, que estabelece (com efeitos ex nunc, isto é, sem possibilidade de retroagir, que vale ‘dali em diante’) o marco inicial da obtenção da nacionalidade secundária.
(B) Naturalização extraordinária (ou quinzenária)
Vamos começar lendo o art. 12, II, “b”, CF/88:
b) os estrangeiros de qualquer nacionalidade, residentes na República Federativa do Brasil há mais de quinze anos ininterruptos e sem condenação penal, desde que requeiram a nacionalidade brasileira. (Redação dada pela Emenda Constitucional de Revisão nº 3, de 1994) |
Da leitura do artigo, você deve ter observado que a naturalização extraordinária só será obtida pelo indivíduo que, possuindo capacidade civil, observar 3 condições:
(1) residência ininterrupta no território nacional por mais de quinze anos;
(2) ausência de condenação penal e
(3) apresentação do requerimento de naturalização.
Perceba que os 3 requisitos são cumulativos (não alternativos), ou seja, todos devem ser cumpridos para que o indivíduo possa se naturalizar: não adianta cumprir só um deles!
Enfim, para encerrar o tópico, farei dois últimos comentários:
(i) Sobre a residência ininterrupta na República Federativa do Brasil por mais de 15 anos, é bom lembrar que ela não é prejudicada em razão de meras ausências temporárias – decorrentes, por exemplo, de viagens de férias no exterior ou compromissos de trabalho fora do país.
(ii) Também destaco que, contrariamente ao que se passa na naturalização ordinária, na via extraordinária o preenchimento de todos os requisitos constitucionais é suficiente para a aquisição da nacionalidade (o sujeito cumpriu os 3 requisitos? Está assegurada sua naturalização extraordinária). O fundamento desta conclusão está no próprio texto constitucional, quando este expressamente determina serem brasileiros naturalizados os estrangeiros de qualquer nacionalidade, residentes na República Federativa do Brasil há mais de quinze anos ininterruptos e sem condenação penal, “desde que requeiram a nacionalidade brasileira”, isto é, desde que apresentem o pedido de aquisição da nacionalidade. A expressão “desde que requeiram a nacionalidade brasileira” é interpretada pela doutrina da seguinte forma: se o indivíduo preenche as duas condições impostas pela Constituição, bastará solicitar a nacionalidade que alcançará a condição de naturalizado.